Aleksandr Dugin|Assimetria|25.01.2009
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Aleksandr Dugin
Assimetria
Um olhar Objectivo
Convйm olhar de novo, sг e objectivamente, para a hodierna posiзгo da Rъssia, sem ofensas, emoзхes, nostalgia e exacerbaзгo. Em que mundo nos encontramos? Que ameaзas pendem sobre nуs?
Qual a configuraзгo do actual mapa do mundo do ponto de vista estratйgico? Que devнamos fazer em tal situaзгo? E que podemos – porque devemos – fazer? Como nos consciencializarmos nуs prуprios do nosso lugar, e como o vкem de fora da Rъssia essas forзas, das quais, efectivamente, muito dependemos? Poucos na nossa sociedade hodierna sгo capazes de, calma e desapaixonadamente, nгo sу responder a estas questхes, como tambйm atй de pф-las.
A Tese do Ocidente – o mundo unipolar
Na aurora do terceiro milйnio constituiu-se o mundo unipolar. O seu ъnico pуlo actual й o Ocidente, os EUA e seus aliados na NATO (com variados graus de interesse). Este mundo unipolar tem um nнtido, claramente distinguнvel, traзo ideolуgico: isto й, um modelo cosmopolita, liberal-capitalista, totalitariamente impositivo. Ao nнvel estratйgico, o mundo unipolar apoia-se na potкncia militar dos EUA. No plano geral, sгo coisas inseparбveis: o potencial estratйgico dos EUA (e a sua configuraзгo especнfica) e o sistema liberal-capitalista em polнtica, economia, e aspecto social.
A unipolaridade confirma-se em ambos os nнveis (estratйgico e ideolуgico), pois que no actual momento na terra nгo hб uma ъnica formaзгo militar que se contraponha ao poder militar dos EUA, nem uma ъnica estrutura ideolуgica, tгo universalmente espalhada, geralmente reconhecida e aceite, como a liberal-capitalista (por vezes abusivamente chamada “democracia liberal”— abusivamente, pois de real democracia pouco tem).
O mundo unipolar й um dado. Se nгo reconhecermos este facto, quaisquer concepзхes nossas ficam fora da esfera da realidade. O reconhecimento deste facto realizado й o traзo inicial de qualquer reflexгo responsбvel sobre a situaзгo, na qual se encontra a humanidade nas primeiras etapas do novo milйnio.
Esta constataзгo, contudo, por sim mesma nгo acarreta qualquer avaliaзгo йtica.
A afirmaзгo de que qualquer coisa hб nгo significa que esta qualquer coisa seja boa.
O mundo unipolar й a tese generalizante, estratйgica, geopolнtica, da concepзгo do mundo. “Tese do Ocidente” que tem a sua genealogia, a sua histуria, as suas etapas. O mundo unipolar nгo surgiu absolutamente por acaso e de repente. Й o resultado da formaзгo da tese do Ocidente como categoria universal, que venceu as alternativas histуricas civilizacionais.
A tese do Ocidente materializou-se no mundo unipolar precisamente atravйs de um processo de ultrapassagem das alternativas histуricas todo-poderosas, as quais em vбrias etapas surgiam ora como sociedades tradicionais, ora como regimes nacionalistas, ora como sistemas socialistas.
Atй aos ъltimos tempos da tese do Ocidente existia uma alternativa formal ao nнvel da estratйgia e da mundivisгo. Os interesses planetбrios opostos das grandes potкncias na primeira metade do sйculo XX, e do mundo bipolar (Oriente socialista – Ocidente capitalista) na segunda metade do sйculo XX, alinharam-se nos sistemas de contrapeso e de oposiзгo, prontos de, a qualquer momento, a acorrerem a um conflito mundial directo com uma conclusгo incerta, pois o potencial militar dos vбrios pуlos era no total comparбvel.
O mundo unipolar й uma realidade tal, que a supremacia da tese do Ocidente sobre os possнveis modelos alternativos de desenvolvimento da civilizaзгo se torna sуlida e evidente.
Isto significa de facto a instalaзгo da hegemonia estratйgica e ideolуgica dos EUA. A consciкncia disto expressou-se no novo termo estratйgico: “hiper-potкncia”. “Grandes potкncias” (atй ao fim da Segunda Guerra Mundial) existiam algumas, “superpotкncias” – apenas duas, mas “hiper-potкncia” sу hб uma.
Tal posiзгo reforзou-se nos documentos fundamentais da polнtica americana: em particular, no relatуrio do ex-Presidente dos EUA, William Clinton, de 1997, “As perspectivas dos EUA no sйculo XXI”.
O Presidente dos EUA justamente afirma, que os EUA em certa etapa (e na sua pessoa toda a tese civilizacional do Ocidente) dominaram todos os seus formais opositores, todas as ameaзas, barreiras e desafios tradicionais simйtricos.
A “nova ordem mundial” estabeleceu-se, e todos os obstбculos formais que se opunham а sua globalizaзгo retiraram-se.
E agora comeзa o mais interessante: neste documento, o Presidente dos EUA fala de que a partir de agora tipos bбsicos de ameaзa a tal construзгo do mundo podem resultar de “novos desafios”, que notoriamente serгo assimйtricos.
Esta posiзгo fixa a realidade objectiva: a partir de agora qualquer alternativa estratйgica ou ideolуgica а nova ordem mundial “serб necessariamente assimйtrica”, desproporcional ao estabelecido sistema planetбrio. Isto nгo й uma oposiзгo formal de duas ou de algumas organizaзхes planetбrias comparбveis, mas processos mais complexos, quando a simples e indiscutнvel lideranзa da “tese do Ocidente” tiver de enfrentar uma realidade imprevista, que seja dificilmente tratбvel.
Condicionalmente no novo documento e na actual linguagem politolуgica ela chama-se “assimetria” ou “novo desafio”.
Ainda um termo aproximado para designar esta realidade potencial – Eurбsia.
Comentбrio do LUSO: Esta “assimetria” bem podia ser, como Eurбsia, a coligaзгo da Rъssia com a China e a Нndia e o Irгo. Aliбs jб hб o Tratado de Shangai em que se aliam estes paнses (se nгo estou muito em erro). Sу este tratado deve ser suficiente para suster a loucura da administraзгo americana na sua paranуica ambiзгo terrorista, que o й, de avassalar todo o mundo. Em todo o caso, pode fazer parte da “assimetria” o asco que a impolнtica polнtica judeo-americana causa em inъmeros paнses por esse mundo fora. Pouco verdadeiramente cultos como sгo, ‘eles’ nгo conhecem a fбbula do lobo que vestiu a pele de ovelha, nem a do sol e do vento que apostaram entre si qual deles seria capaz de fazer um homem despir o seu capote. O mais forte em certos casos й o mais fraco. Creio bem que tal й o caso judeo-americano. Haja Deus!
Unipolaridade com o sinal mais ou o sinal menos?
Atrбs dissemos que o reconhecimento do facto da unipolaridade nгo significa o reconhecimento da sua idoneidade, ou do seu conteъdo positivo. A liberdade humana permite-nos interpretar qualquer facto no sistema dual (no mнnimo) da йtica. Se nуs o avaliarmos como bom, nуs apoiamos a sua realidade com a forзa do nosso acordo moral. Mas nуs podemos aceitar este facto realmente existente como um mal, uma injustiзa, um fenуmeno negativo. Entгo – nгo negando a sua presenзa – nуs procuraremos os meios de o desenraizar, corrigir, transformar ou eliminar. Nesta liberdade йtica contra a ditadura da existкncia actual, surge mais elevada a dignidade do ser humano. (Frase lapidar, sublinhada pelo tradutor. LUSO).
O mundo unipolar й um facto. Mas para um enorme sector da humanidade contemporвnea, este й um facto inteiramente e na sua totalidade negativo, trбgico, repelente. E se nгo hб hoje alternativas formais a tal mundo, isto ainda de maneira alguma significa que ele pode ou deve existir.
No mundo terrestre nгo pode existir tal unidade absoluta, e qualquer tese, por muito universal e global que possa ser, pode e deve esbarrar com a sua antнtese.
Para nуs agora o mais importante resume-se em compreender com clareza: a alternativa ao mundo unipolar, a antнtese em relaзгo а “tese do Ocidente”, que se tornou global e pretende a universalidade, a partir de agora e em definido prazo se transformou de regiгo formal e simйtrica em regiгo nгo formal e assimйtrica, na regiгo do “novo”, “invisнvel”, ainda apenas com o dever de encontrar claramente os traзos distintivos..
A antнtese do mundo unipolar estб na esfera da assimetria.
E este й exactamente um facto tгo indiscutнvel como o facto da transformaзгo dos EUA numa “hiperpotкncia”.
A correspondente procura de alternativa а unipolaridade deve fazer-se em novas regiхes estratйgico-ideolуgicas. Isto nгo significa que as anteriores alternativas а tese do Ocidente em tudo e por tudo percam o seu significado. Nгo, elas conservam-no, mas com aspecto desvirtuado, em novo espaзo contextual com a necessбria correcзгo. O mais importante й que neste novo espaзo de assimetria, as anteriores alternativas se empenhem numa nova combinaзгo, e os seus elementos, muitas vezes perifйricos, avancem, e aquilo que pareceu magistral, se retire, pelo contrбrio, para um plano de trбs.
(traduzido do russo)
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